3 de nov. de 2015

D. Penal - Fato Típico: Resultado

Fato Típico:
Resultado


                CRIME

Fato Típico
Ilícito ou Antijurídico. Causas excludentes da ilicitude:
Culpável
Conduta
Estado de Necessidade
Imputabilidade
Resultado
Legítima Defesa
Potencial Consciência Sobre a Ilicitude do Fato
Nexo de Causalidade
Estrito Cumprimento de Dever Legal
Exigibilidade de Conduta Diversa
Tipicidade
Exercício Regular de Direito















Crime é todo fato típico, ilícito e culpável. O resultado é um dos elementos que compõe uma das três características de uma infração penal, no caso o fato típico. Foi visto anteriormente sobre a conduta. O resultado seria o efeito gerado pela conduta. É o fruto produzido pela ação ou omissão do agente. A morte é o resultado do homicídio, a subtração de patrimônio alheio é o resultado do crime de furto, a destruição de coisa alheia é o resultado do crime de dano. Observa-se que a morte e a subtração e destruição de patrimônio foram modificações promovidas no mundo exterior pela conduta do agente. Tais modificações são conhecidas como resultados naturalísticos. Quando a conduta transforma algo no entorno, no lugar, no mundo natural e o ser humano através de seus sentidos consegue captar essa transformação, o resultado ganha um sentido naturalístico. Exemplo de fácil verificação é a lesão corporal causada por um agente em alguém. Com os olhos, ou dependendo da lesão até mesmo com o tato, qualquer ser humano pode certificar-se. Contudo, como leciona Capez e Bonfim (2004, p. 318), nem todo crime possui resultado naturalístico, uma vez que há infrações penais que não produzem qualquer alteração no mundo natural. Por exemplo, violação de domicílio, também ameaçar, caluniar, difamar ou injuriar alguém são condutas criminosas que não provocam qualquer alteração no mundo físico, não se vê um resultado prático, uma modificação externa prática em tais condutas. Se o art. 13 do Código Penal estabelece que todo crime precisa de resultado, por que a calúnia, a difamação e a injúria são tipificados como crimes? Porque promovem alterações no mundo jurídico. Porque a lei prevê crimes em que não existe tal modificação no mundo exterior (MIRABETE, 2005, p. 110). Porque o resultado também tem um sentido normativo/jurídico e não apenas naturalístico. Deve-se buscar um conceito jurídico ou normativo de resultado (MIRABETE, 2005, p. 110). Para haver crime não basta apenas que sejam realizadas mudanças no mundo externo, a ameaça a um bem jurídico não produz tais mudanças, mas faz parte também do conceito de resultado para o Código Penal. Portanto, o resultado, na definição de Mirabete (2005, p. 110), deve ser entendido como lesão ou perigo de lesão de um interesse protegido pela norma penal. Conclui-se que todo crime tem que ter um resultado normativo/jurídico, tal resultado é aquele que o art. 13 procura, caso contrário, o fato não é crime.  

Dentro da zona do resultado, os crimes podem ser material, formal ou de mera conduta. 

Crime Material
É aquele em que há uma modificação no mundo externo, há um resultado naturalístico provocado pela conduta do agente. O resultado está descrito na lei e há a consumação do crime com a ocorrência deste resultado previsto. Exemplo é a morte no homicídio, a destruição no crime de dano. Também o infanticídio, o aborto, lesão corporal, bigamia, causar incêndio, explosão, epidemia entram no rol de exemplos. 

Crime Formal
Este não exige que o resultado que o agente intenciona em sua conduta aconteça, mas a sua ação ou omissão já se configura infração penal. O crime está consumado independente que um resultado naturalístico ocorra. Há a previsão do resultado pela lei, mas não é exigido que ele ocorra para a consumação do delito. O crime está consumado com a mera conduta. No crime formal, o resultado naturalístico é irrelevante, embora possível (BONFIM, CAPEZ, 2004, p. 318). Exemplos: extorsão, difamação, incitação ao crime.

Extorsão:
Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa.

Conduta: constranger alguém.
Resultado: seria a intenção (o intuito) do agente,  a vantagem econômica.
Crime Formal: a própria ação de constranger já torna consumado o crime, independente da obtenção da vantagem econômica. A lei prevê o resultado - vantagem econômica - mas não exige que este aconteça para se consumar o crime. 

Difamação:
Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação.

Conduta: difamar alguém.
Resultado: seria a ofensa à reputação da vítima. 
Crime Formal: quer a vítima sinta-se ofendida ou não, apenas o ato de difamar do agente já é configurado crime. 

Incitação ao crime
Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime.

Conduta: incitar.
Resultado: prática de algum crime.
Crime Formal: ocorrendo ou não a prática do crime, a incitação ao seu acontecimento já é uma conduta criminosa.

Crime de Mera Conduta
Neste, definitivamente, nenhum resultado é exigido pela lei para que o crime seja realizado e nem a lei prevê qualquer resultado. A mera conduta do agente já é tipificada como criminosa. A diferença do crime de mera conduta para o crime formal é que neste a lei prevê o resultado, enquanto naquele o resultado não está previsto pela lei. Exemplos de crimes de mera conduta: ato obsceno, moeda falsa, violação de domicílio, omissão de notificação de doença, usurpação de função pública. 

Ato Obsceno
Art. 233 - Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público.

Moeda Falsa
Art. 289 - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metálica ou papel-moeda de curso legal no país ou no estrangeiro.

Usurpação de função pública
Art. 328 - Usurpar o exercício de função pública

Em nenhum dos artigos acima citados a lei descreveu algum resultado, a mera realização da conduta já se configura o crime. Estão descritas apenas as condutas. 

Inter Criminis
É o caminho do crime, o percurso criminoso. É a trajetória percorrida pela infração penal, do seu ponto de partida (vontade) até a sua meta criminosa (consumação). O inter criminis possui as seguintes etapas: cogitação, preparação, execução e consumação. Podendo também haver o exaurimento. 

a) Cogitação: é o momento que pensamentos criminosos emergem na mente do agente, fazendo com que ele premedite, cogite, analise, raciocine sobre o crime que ele quer praticar. O que se passa na mente de um ser humano não é do interesse do Direito Penal, portanto, a atitude interna não é passível de pena.

b) Preparação: é o momento que o agente faz o preparo de tudo o que é necessário para pôr o seu plano em prática. Se quer sequestrar, organiza o cativeiro, observa o dia-a-dia da vítima, dirige-se ao local onde pretende capturá-la. Se quer causar incêndio, buscará fósforo, isqueiro, álcool, gasolina. Se quer matar, adquire arma, junta munição. Se quer furtar carro, arruma pé de cabra para abrir a porta. Nesta fase do inter criminis o agente ainda não iniciou a agressão ao bem jurídico (BONFIM, CAPEZ, 2004, p. 433). Também não se pune a preparação, exceto quando o ato preparatório por si só é um crime autônomo. Cabem aqui nas exceções a associação criminosa (art. 288), crime de ameaça (art. 147). Um outro exemplo é o art. 291 onde fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. O agente está preparando o 'terreno' para criar moeda falsa e tal preparo já se constitui crime. 

Em regra, no entanto, a cogitação e a preparação não são puníveis. 

Art. 31 - O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado.

c) Execução: é o momento que se começa o ataque ao bem jurídico. É quando haverá a tentativa ou a consumação do crime. Quando o agente começa a se ajustar ao que está tipificado como infração penal. Põe suas pegadas nas pegadas do tipo penal. Na fase da execução, a conduta do agente é ou vai sendo esculpida na forma perfeita do fato típico. Por exemplo, para o crime de homicídio (art. 121), o agente depois que premeditou matar e se preparou com uma pistola, desfere tiros em direção da vítima. Ou ele mata, ou, pelo menos, tentou matar, ambos prescritos no CP. Na fase executória, o agente põe em execução o tipo de ação que pode efetivamente consumar o crime e se enquadrará perfeitamente ao prescrito na lei. 

Na fase preparatória o sujeito pode estar completamente pronto para pôr o crime em ação, mas somente entra no momento executório quando sua conduta pode de forma efetiva promover lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Quando aquele que quer furtar persegue a vítima, ele ainda não está em seu momento de execução, mas preparando-se para praticar o furto. No instante que lança a mão por sobre a bolsa da vítima, neste exato instante, ele inicia o ato executório. Se o agente não deu o bote na coisa alheia, ele ainda não furtou, ainda não entrou na casa do art. 155 (furto). Não poderia, portanto, ser punido. Pois, quem provaria que ele praticaria furto? O agente que quer matar e que se esconde por detrás de um muro e por um buraco observa a vítima se aproximar com a arma apontada para a sua cabeça apenas entra na fase de execução se ele apertar de fato o gatilho para acertar a vítima. É nesse instante que sua conduta pode, efetivamente, consumar o crime. Caso contrário, ainda estaria no momento preparatório. Não deflagrando tiros não há tentativa de homicídio. Contudo, ele poderia ser punido por porte ilegal de arma, pois este fato, por si só, já se constitui crime. 

Pode haver confusão em discernir onde acaba a preparação e onde começa a execução, pois há diferenças sutis entre ambos e saber tais diferenças é por demais importante, pois enquanto ato preparatório, o fato não é passível de punição, mas a partir da execução sanções já podem ser imputadas ao agente. Há situações de fácil distinção, no entanto, há outras de dificílima diferenciação. A controvérsia reside naquela zona cinzenta na qual, por mais que nos esforcemos, não teremos a plena convicção se o ato é de preparação ou de execução (GRECO, 2015, p. 312).

d) Consumação: o art. 14 do CP define o crime consumado. 

Art. 14 - Diz-se o crime:
I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;

De acordo com o tipo do crime será o momento de sua consumação:

- Nos crimes materiais, o delito se desfecha, se realiza quando há o resultado naturalístico previsto pela norma penal. No homicídio, a consumação se dá quando há a morte da vítima. No furto, quando a coisa alheia é subtraída de seu proprietário.

- Nos crimes de mera conduta, há a consumação a partir da conduta delituosa do agente, sem a necessidade de ocorrer resultado. Exemplo é o ato obsceno. 

- Nos crimes formais, o delito é consumado com a simples conduta do agente, ocorrendo ou não o resultado almejado por ele. Na incitação ao crime, o ato de incitar publicamente outros a praticarem infrações penais, já torna o crime consumado. Caso um outro agente toma essa ideia pra si e vem a cometer um delito, o crime - já consumado - entra na fase do exaurimento. 

e) Exaurimento: significa a produção de resultado lesivo a bem jurídico após o delito já estar consumado, ou seja, é o esgotamento da atividade criminosa, implicando em outros prejuízos além dos atingidos pela consumação (NUCCI, 2005, p. 153). É quando o ato do agente vai além da consumação. Após o crime ser consumado, ele vai mais além e pratica outras condutas delituosas que agravam o crime. O exaurimento se estabelece de acordo com o tipo de consumação que determinado crime exige. Exemplo é o agente que após matar a vítima com uma punhalada, não contente, a esquarteja. A consumação do delito se deu com a morte da vítima e o exaurimento com o esquartejamento. Nos crimes formais o exaurimento é com a produção do resultado.   

O Inter Criminis na fase executória e a Tentativa

Art. 14 - Diz-se o crime:
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.
Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.

Para se falar em crime tentado é fundamental ser iniciada a execução, porém o delito não vai se consumar porque será interrompido por motivo de circunstâncias alheias à vontade do agente. O Código Penal estabelece que o crime tentado não é consumado por esse motivo apenas. Do Código tem que ser eficiente cada letra e o intérprete não pode fugir de suas fronteiras. Se o crime se interromper por motivo diferente de circunstâncias alheias à vontade do agente, não é possível se falar em tentativa, absolutamente. Se a consumação não ocorre por vontade do agente, configura-se a desistência voluntária ou o arrependimento eficaz e não a tentativa (MIRABETE, 2005, p. 161). 

Os elementos da tentativa são:
- Dolo: é o da vontade do crime consumado. 
- Início dos atos de execução.
- Não-consumação do crime por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Espécies de tentativa: 

Tentativa Perfeita ou Crime Falho
Todos os atos executórios foram desempenhados para que o resultado delituoso ocorresse, mas o crime não é consumado. O agente consegue utilizar dos meios que ele dispunha, mas o resultado não é produzido. O agente fez tudo que lhe era possível para alcançar o resultado (NORONHA, 1991, p. 124). Exemplo é o agente que descarrega munições de seu revólver no desafeto com a intenção de matá-lo e termina o ato executório considerando que o matou, mas os médicos conseguem salvar a sua vida. Responde por tentativa de homicídio.
- Na tentativa perfeita, o ato executório é finalizado.   

Tentativa Imperfeita
Iniciados os atos de execução pelo agente, estes não vão se concluir pois são interrompidos por circunstâncias alheias à sua vontade.  O sujeito ativo não consegue praticar todos os atos necessários à consumação por interferência externa (MIRABETE, 2005, p. 158). Algo acontece durante a execução e o agente é frustrado em sua intenção de consumar o crime. Exemplo é o agente que pretende matar seu desafeto e o ofende com facão e um terceiro surge para impedir a continuação do delito. 
- Na tentativa imperfeita, o ato executório não chega a ser finalizado. 

Tentativa Cruenta ou Vermelha
O significado de cruento é aquilo que fere, sanguinolento, cruel. Na tentativa cruenta, a vítima é atingida e ocorre lesão. A tentativa cruenta pode ser também tanto perfeita quanto imperfeita. 

Tentativa Incruenta ou Branca
A vítima não chega a ser atingida. Esta também pode ser perfeita ou imperfeita.

Desistência Voluntária e Arrependimento Eficaz

Art. 15 - O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados.

Aqui, o agente tem chances de continuar a execução do crime ou de permitir que seja consumado, mas por vontade própria desiste de prosseguir durante a execução ou se arrepende depois do ato feito e se empenha para impedir que um resultado se produza. Se diferem da tentativa, pois na tentativa o crime não é consumado por circunstâncias alheias à vontade do agente e aqui há o ato voluntário do agente para que o resultado não se produza depois de iniciada ou terminada a execução. 

Desistência Voluntária 
Esta está na primeira parte do art. 15 do CP. Durante a execução, o agente desiste de consumar o crime por sua própria vontade. Se acontecer, por exemplo, na situação de um sujeito que quer matar seu inimigo ter 2 munições em sua pistola, executar os dois disparos no corpo da vítima, não se consumar o crime e este sujeito se afastar da cena, não significa que ele desistiu. O que ocorreu foi que o instrumento para praticar o crime por ele usado já não teria eficiência para a consumação do homicídio. Não foi uma desistência voluntária, desistiu porque não pôde prosseguir com seu plano em função da arma. Então, à ele seria imputado o crime de tentativa de homicídio. Nesse exemplo, a tentativa foi perfeita porque ele se utilizou por completo do meio que ele possuía para consuma o crime, ou seja, o disparo dos dois projéteis.

A desistência voluntária é uma reconsideração interna do agente a respeito do ato que ele desempenha, que o forja a abandonar o seu intento durante o processo executório, quando tinha totais condições de prosseguir para a consumação do resultado. Ou seja, ele abandona por um momento interno dele mesmo que pode estar conectado com remorso, medo, angústia, impacto de sua própria conduta, etc. Na verdade, as razões que o fizeram abandonar a sua empreitada não importam, o que importa é que tenha sido de forma voluntária a sua renúncia. Noronha (1991, p. 127) esclarece: os motivos não contam. Todavia há de ser voluntária. Contudo, se o agente abandona o processo da execução por algo distante da sua vontade, configura-se tentativa. 

Exemplo de desistência voluntária é o sujeito que quer matar seu rival e vai ao seu encontro com a arma completamente municiada. Após disparar um tiro se aproxima da vítima para disparar outro tiro, mas ao vê-la alvejada no braço magoa-se com aquilo e decide não mais levar adiante sua intenção criminosa, embora houvesse chances de continuar com sua conduta de matar. Com mágoa ou sem mágoa, se o agente desistiu voluntariamente não ocorre a tentativa, e é isso o que o Código pede, que o ato de desistir seja voluntário. Nesse caso hipotético, o agente responderia apenas pelos atos já praticados, como estabelece a última parte do art. 15 do CP, que seria o de lesão corporal. 

Exemplos ilustrados por Mirabete (2005, p. 163) quando da punição dos atos já praticados: se o agente penetrou em residência alheia visando o furto, responderá por violação de domicílio; se praticou ato visando o homicídio, responderá por lesão corporal ou por perigo para a vida ou saúde de outrem; se pretendia inicialmente praticar o estupro, responde por constrangimento ilegal ou por atentado violento ao pudor se praticou algum ato libidinoso; se praticou arrombamento para o furto, por dano etc. 

Segundo a fórmula de Frank, citada por Mirabete (2005, p. 162), existirá a desistência voluntária sempre que o agente pode prosseguir, mas não quer; se ele quer, mas não pode, haverá tentativa. 

A desistência voluntária se alinha com a tentativa imperfeita, estudada anteriormente, onde o ato executório não chega ao fim. A diferença entre ambos está na vontade do agente.

Arrependimento Eficaz
O agente esgotou em atos de execução toda a potencialidade agressiva. Arrependeu-se, porém, e evita, com sucesso, a consumação (NORONHA, 1991, p. 127).

Quando o agente pratica por completo todos os atos executórios, se arrepende e tenta evitar que um resultado aconteça. Localiza-se entre a execução e a consumação. Enquanto na desistência voluntária há uma interrupção durante a execução, esta que não se completa, no arrependimento eficaz o ato executório se completa, mas o agente se arrepende do feito e tenta consertar seu erro impedindo que a consumação ocorra. A vontade inicial que ele tinha de produzir um resultado se modifica e muito menos agora quer assumir o risco de produzi-lo. Inicialmente, sua atitude era de ataque a um bem jurídico, após a execução a atitude é de proteção. 

Exemplo é o sujeito que com uma seringa mortalmente envenenada fura seu rival e após tal ato se arrepende e leva a vítima ao hospital para tentar salvá-la da morte. Se o resultado naturalístico ocorrer, a morte, responde o agente pelo crime de homicídio consumado. Caso a vítima seja salva pela equipe médica e nenhuma sequela restou em seu corpo, o agente não responde por crime algum. Compreende-se, assim, que o fato se torna atípico, exclui-se a tipicidade. Houve a conduta delituosa, mas não gerou um resultado, sem resultado o fato se torna atípico. 

O Código fala em eficaz, ou seja, a tentativa de reparar o dano tem que surtir efeito, tem que ser eficiente, o agente tem que ter sucesso nessa empreitada de consertar o erro para ser beneficiado com a extinção do instituto da tentativa. Não importa a razão de não ter tido sucesso na sua operação de salvamento, qualquer que seja o motivo, se a vítima não for favorecida e mesmo que ela não queira ser favorecida, responde o agente por tentativa ou pelo crime consumado. A palavra usada pela carta repressiva é eficaz, sendo ineficaz, o agente não se beneficia. A eficácia é as asas do arrependimento, sem elas o agente não tem a chance de voar da jaula da punição. 

O arrependimento eficaz alinha-se com a tentativa perfeita no contexto da completude da fase de execução, mas diferencia-se em relação a vontade do agente. 

Observação:
1- Por motivos de política criminal, estimulando-se o agente a não consumar o crime, prevê a lei, no art. 15 do CP, duas hipóteses de tentativa abandonada: a desistência voluntária e o arrependimento eficaz (MIRABETE, 2005, p. 169). Portanto, ambos se tornam um benefício dado ao agente na forma de recursos que o Código Penal usa para afastar o instituto da tentativa e se tornar um meio de influenciar o agente a não concluir o crime, caso contrário, pior seria para a vítima. É algo que pode proteger o bem jurídico atacado pelo agente.  

Arrependimento Posterior

Art. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.

Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
III - ter o agente:
b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;

Esse se dá após o crime ser consumado. O Código estabelece que a pena será reduzida de um a dois terços, ou seja, preenchendo todos os requisitos do art. 16 obrigatoriamente haverá redução de pena. Tem incidência se: 

- Não houver violência ou grave ameaça: explica Bonfim e Capez que, se violência é empregada contra a coisa e não contra a pessoa (...) é possível a aplicação do benefício (2004, p. 447). O Código fala à pessoa. Ou seja, se o agente destruir o vidro do carro para furtar uma bolsa e não investe qualquer violência ao motorista ele pode ser beneficiado com o instituto do arrependimento posterior. 

- Reparar o dano ou restituir a coisa: se for restituir, a coisa tem que estar intacta, deve ser devolvida exatamente nas mesmas condições de quando foi tomada. Se houver dano, a reparação tem que ser perfeita. No exemplo supra citado, caso o meliante se arrependa, ele terá que consertar o vidro do carro da vítima e devolver a bolsa com absolutamente tudo o que havia dentro, nem mesmo um pedaço de papel deve faltar, salvo se a vítima aceitar o recebimento parcial.

- O ato for voluntário: apenas há diminuição da pena se o agente por iniciativa própria repara o dano ou restitui a coisa, não se prestando a isso a apreensão da res pela Polícia, a devolução da coisa por coação física ou moral, a reparação por decisão judicial, o ressarcimento efetuado por terceiros etc (MIRABETE, 2005, p. 177). Um ato voluntário pode ser espontâneo ou não-espontâneo. Espontâneo é quando o agente, por si mesmo, reconsidera sua atitude. Não-espontâneo é quando por influência de outros aceita os conselhos. Seguindo o exemplo já citado, se o meliante que furtou a bolsa é perseguido e ao se ver encurralado de gente é coagido a devolver, não se verifica um ato voluntário. 

- Feito até o recebimento da denúncia ou da queixa: se antes de receber a denúncia ou a queixa o agente que não empregou violência ou grave ameaça à pessoa reparar o dano ou devolver a res furtiva, será beneficiado com a redução de pena. Incide a última parte do art. 16 do CP. Porém, se depois da denúncia ou queixa ele resolve reparar ou devolver antes do julgamento, de forma voluntaria e eficiente, a pena será atenuada, ou seja, nessa situação incidirá a última parte do art. 65, III, b do CP. Na pena reduzida há estabelecida a quantidade da redução e na pena atenuada não há, quem decide nesta é o magistrado.  

Observação:
Sem que ocorram todos esses requisitos do art. 16 não será aplicada a redução da pena. Se faltar uma dessas determinações, em nada terá efeito o arrependimento.

Arrependimento posterior em cheque sem fundos e peculato culposo
Foi visto que o arrependimento posterior é causa de redução de pena de um a dois terços. Porém, existe exceções na punibilidade quando se fala em peculato culposo (crime contra administração pública) e estelionato mediante cheque sem fundos. 

- No peculato culposo, se o acusado reparar o dano da coisa pública antes do julgamento ele não sofrerá nenhum tipo de pena. Será extinta a punibilidade. Não se fala aqui em peculato doloso, mas culposo. Se fosse doloso incidiria os critérios do art. 16. 

- No estelionato mediante cheque sem fundos, se o acusado age sem fraude, ou seja, se ele não sabia que não havia fundos suficientes para o cheque ser compensado adequadamente e realiza o pagamento antes da denúncia, não há crime. Contudo, havendo fraude incidirá as regras do art. 16 do CP (arrependimento posterior).

Crime Impossível

Também chamado de tentativa inidônea, tentativa impossível, tentativa inadequada e quase crime. Aqui, o Código Penal adotou a teoria temperada, na qual exige que para identificar um crime impossível, o meio e o objeto usados devem ter incapacidade absoluta de consumar o crime. Se houver uma possibilidade, mesmo que mínima, do crime ser consumado, não se pode falar em crime impossível, mas sim tentativa punível. O que orquestra a identificação do crime impossível são as exigências da teoria temperada, ou melhor, aquilo determinado no art. 17 da carta repressiva:

Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

O artigo fala em tentativa, pois impossível é um crime ser consumado quando o meio e o objeto empregados são incapazes, em absoluto, de produzir um resultado... tentativa impune. Crime impossível é um tigre de papel, sem poder de ataque ou ameaça a um bem jurídico. 

- Quando o meio/instrumento é absolutamente ineficaz: exemplo é o agente que quer matar seu rival envenenado e ministra linhaça ao invés de 'chumbinho' para ele ingerir, viu que não deu certo e parte em direção ao desafeto e tenta lhe matar, mas com revólver descarregado. Em ambas as tentativas o agente nem mesmo começou a matar, pois os meios empregados (linhaça e arma descarregada) jamais produziriam um homicídio... crime impossível. 

- Quando há absoluta impropriedade do objeto: exemplo é o agente que vê seu rival no chão deitado e aproveita para dar várias facadas por sobre o seu corpo na intenção de matá-lo, quando a vítima já estava morta. Crime impossível de homicídio. Noronha (1991) traz o exemplo da mulher que equivocadamente pensa que está grávida e tenta realizar aborto. O bem jurídico, o feto, não existe, sendo assim, impropriedade absoluta do objeto. 
Bonfim e Capez (2004, p. 454) trazem um exemplo no delito de roubo, caso a vítima não esteja trazendo consigo qualquer quantia, haverá crime impossível ante a impropriedade absoluta do objeto; no entanto, subsidiariamente, o agente responderá pelo delito de constrangimento ilegal, funcionando o tipo do art. 146 do Código Penal como "soldado reserva".

Crime Impossível e o flagrante preparado 

Súmula 145 STF:
Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.

É o denominado crime de ensaio, ou seja, quando um terceiro provoca o agente à pratica do delito, ao mesmo tempo em que age para impedir o resultado. Havendo eficácia na atuação do agente provocador, não responde pela tentativa quem a praticou. (NUCCI, 2005, 173)

Quando o agente é estimulado pela vítima, ou mesmo pela autoridade policial, a cometer a infração penal com o escopo de prendê-lo (GRECO, 2015, p. 349). 

Arma-se uma cena de propósito delituoso pelo personagem que quer preparar o flagrante, em que põe como protagonista do delito a pessoa que ele pretende prender ao instigá-la a cometer o crime. Essa dramatização torna-se para o Direito Penal uma cena fictícia, sem valores reais e sem prestígio para a Justiça. Se o sujeito, após a provocação, for tomado em flagrante, será considerado crime impossível. Exemplo clássico trazido por Mirabete (2005, p. 167) é do patrão que, desconfiado de um empregado, facilita tudo para que seja atraído a uma cilada e, assim, apanhá-lo no momento da subtração. O agente foi instigado a praticar um crime pela conduta daquele que o provocou. Exemplo é um investigador policial à paisana que em seu processo investigatório de tráfico persuade o sujeito que ele quer prender a adquirir drogas com terceiros para vender e este, ao ceder a pressão persuasiva do investigador, adquire a droga e na posse dela o policial lhe dá voz de prisão. Tal situação arranjada pelo instigador é considerada pelo Direito Penal como crime impossível a título de flagrante preparado. É presumido que se não houvesse a instigação tal crime não ocorreria. 

Bonfim e Capez (2004, p. 455) citam alguns outros exemplos de crime impossível: investigadora grávida  pede para médico fazer aborto ilegal e depois o prende em flagrante; detetive simula querer comprar maconha e prende o traficante. 

Referências Bibliográficas:
BONFIM, Edilson Mougenot. CAPEZ, Fernando. Direito Penal. Parte Geral. São Paulo: Saraiva. 2004

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus. 2015.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Código Penal Interpretado. 5. ed. atual. por Renato N. Fabbrini. São Paulo: Atlas, 2005

____. Manual de Direito Penal. Parte Geral. 22. ed. rev. e atual. por 
Renato N. Fabbrini. São Paulo: Atlas, 2005

NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal 1. 29. ed. rev. e atual. por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva,  1991.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 5. ed. rev., atual., ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005

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