30 de mar. de 2017

D. Administrativo: Desapropriação

DESAPROPRIAÇÃO

CF, art. 5º, XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;

É uma forma de intervenção estatal na propriedade. Hely Lopes conceitua como "a transferência compulsória de propriedade particular (ou pública de entidade de grau inferior para a superior) para o Poder Público ou seus delegados, por utilidade ou necessidade pública ou, ainda, por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro (CF, art. 5º, XXIV), salvo as exceções constitucionais de pagamento em títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, no caso de área urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada (CF, art. 182, § 4º, III), e de pagamento em títulos da dívida agrária, por interesse social (CF, art. 184)" (1993, p. 507). 

Desapropriação é forma originária de aquisição, pelo fato de que não decorre de qualquer título anterior, sendo que o bem desapropriado fica com o seu histórico livre e desembaraçado, não se tornando suscetível a qualquer possibilidade de reivindicação e livre de ônus anteriores. 

PROCEDIMENTOS
O procedimento é administrativo, obrigatoriamente, podendo entrar em procedimento judicial. 

- Procedimento Administrativo
1ª fase: tem natureza declaratória. Aqui, o Estado indica a necessidade pública ou a utilidade pública ou o interesse social. 

Na declaração expropriatória devem constar

a) a descrição precisa do bem a ser desapropriado.
b) a finalidade da desapropriação.
c) o dispositivo legal que autoriza a desapropriação. 

Efeitos

a) permissão para que as autoridades competentes tenham o poder de entrar no bem desapropriado.
b) início da contagem do prazo decadencial.
c) indicação do estado em que se encontra o bem.
d) já pode ser concedido licenças para a relização de obras no local. 

Art. 6º A declaração de utilidade pública far-se-á por decreto do Presidente da República, Governador, Interventor ou Prefeito.

Art. 8º O Poder Legislativo poderá tomar a iniciativa da desapropriação, cumprindo, neste caso, ao Executivo, praticar os atos necessários à sua efetivação.

Obs. 1: as benfeitorias voluptuárias feitas depois da declaração, não são indenizáveis. São indenizáveis as benfeitorias úteis (se o proprietário dor autorizado pelo Poder Público) e as benfeitorias necessárias. 

Obs. 2: prazos para efetivar a desapropriação

- Se for declarada a utilidade pública: o decreto caduca em 5 anos

- Se for declarada o interesse social: a partir da expedição do decreto, o prazo é de 2 anos

Obs. 3: se ocorrer a caducidade do prazo, somente após passado 1 ano poderá aquele mesmo bem ser objeto de nova declaração. 

2ª fase: natureza executória. Estima-se a indenização e a transferência do bem ao domínio do expropriante, no caso de haver consenso entre o Poder Público e o expropriado. Se não houver acordo do valor a ser indenizado, a discussão será por via judicial. O Poder Judiciário não irá verificar a utilidade pública ou interesse social, mas o valor a ser pago.

PRESSUPOSTOS/REQUISITOS DA DESAPROPRIAÇÃO

a) necessidade pública: decorre de situações de emergência que para serem resolvidas de forma satisfatória desapropria-se o bem.

b) utilidade pública: é quando a desapropriação é conveniente, mão não indispensável. Exemplos: desapropriar imóveis para a construção de escolas ou hospitais públicos, parques, ruas, etc.  

Obs.: o Decreto-Lei 3.365/1941 apenas utiliza a expressão 'utilidade pública', o que significa que abrange também a necessidade pública. A Constituição emprega distintamente o termo necessidade e utilidade.

c) interesse social: aqui os bens desapropriados não se destinam ao Estado, mas a um interesse coletivo. Exemplo é a desapropriação de terras rurais para reforma agrária. Ver art. 2º da Lei 4.132/62.

d) justa e prévia indenização: necessário haver o pagamento prévio de indenização. 

COMPETÊNCIAS

- Competência legislativa: a União legisla sobre a desapropriação (art. 22, II, CF). Observar que o parágrafo único do art. 22 aduz que lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre a desapropriação. 

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: II - desapropriação;

Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

- Competência declaratória: quem pode expedir o decreto de desapropriação declarando a utilidade pública ou o interesse social: União, DF, Estados, Municípios e Autarquias se a lei que as criou traz expressamente o poder de declarar. 

Obs.: No caso de desapropriação por interesse social para o fim específico de promover a reforma agrária, a competência da declaração é privativa da União. 

- Competência executória: "para promover efetivamente a desapropriação, providenciando todas as medidas e exercendo as atividades que culminarão na transferência da propriedade, é mais ampla, alcançando, além das entidades da Administração direta e indireta, os agentes delegados do Poder Público, como os concessionários e permissionários" Alexandrino e Paulo (2012, p. 992). 

Obs.: Dec-Lei 3.365/41 - Art. 3º Os concessionários de serviços públicos e os estabelecimentos de caráter público ou que exerçam funções delegadas de poder público poderão promover desapropriações mediante autorização expressa, constante de lei ou contrato.

AUTORIZAÇÃO CONSTITUCIONAL E ESPÉCIES

1. Desapropriação Ordinária: prevista no art. 5º, inc. XXIV da CF. (a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição). Pagamento da indenização em dinheiro ou por títulos da dívida pública. 

1.1 Desapropriação por Zona: caso de desapropriação de áreas vizinhas necessárias à expansão posterior da obra e na hipótese do Estado verificar áreas contíguas que irão valorizar extraordinariamente. 

Art. 4º A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em consequência da realização do serviço. Em qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis à continuação da obra e as que se destinam à revenda.

1.2 Desapropriação indireta: quado o Estado se apossa de bem particular sem observar os requisitos da declaração e indenização prévia. É um esbulho, pois o ato de desapropriar não decorre de qualquer procedimento formal. 

2. Desapropriação Extraordinária: rural (art. 184, CF) ou urbana (art. 182, § 4º, CF). Pagamento da indenização apenas por títulos da dívida pública. 

2.1 Desapropriação urbana: prevista no art. 182, § 4º, III da CF. Incidem sobre imóveis que não atendem ao Plano Diretor da cidade. O Poder Público desapropria para que o solo se adéque às necessidades urbanas.

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

§ 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:


I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

2.2 Desapropriação rural: prevista no art. 184 da CF. Incide em imóveis rurais para fins de reforma agrária.

Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.

§ 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.

(...). 

Obs.: CF, Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:

I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;

II - a propriedade produtiva.

3. Desapropriação Confiscatória: de competência privativa da União. 

Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.

BENS DESAPROPRIÁVEIS

Art. 2º Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios.

Em regra, qualquer bem móvel ou imóvel, corpóreo ou incorpóreo, que tenha valor patrimonial pode ser desapropriado. Exemplos: ações, cotas, direitos societários, subsolo, espaço aéreo etc. 

Os bens públicos podem ser desapropriados. Contudo, deve-se observar o disposto no § 2º do art. 2º do dec-lei 3.365/41: 'os bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão ser desapropriados pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização legislativa'.

Obs. 1: a União não pode ter os seus bens desapropriados. 

Obs. 2: a desapropriação de bens públicos que pertencem aos entes federados segue uma escala de descendência, ou seja, a União pode desapropriar bens do DF, dos estados e dos municípios. Os estados podem desapropriar bens de município (em seu território). Mas o sentido inverso não pode ocorrer. 

Obs. 3: essa regra de descendência vale para os bens dos entes administrativos vinculados ao ente federado. Assim, um estado não pode desapropriar bens de uma autarquia federal; um município não pode desapropriar bens de uma fundação pública estadual etc.  

Obs. 4: ressalva

Por jurisprudência do STF e STJ, "um município ou um estado pode desapropriar bens de uma pessoa administrativa vinculada à União, desde que haja prévia autorização do Presidente da República, concedida mediante decreto" Alexandrino e Paulo (2012, p. 989). 

Obs. 5: não podem ser desapropriados as margens dos rios navegáveis, a moeda corrente do país e os direitos personalíssimos. 

Súmula 479 STF - As margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização.


AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO


Partes
A ação de desapropriação apenas pode ser proposta pelo Poder Público ou seu delegatário, o proprietário do bem é o réu. O Ministério Público intervém em qualquer processo de desapropriação.

Contestação

Art. 20. A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.

É permitido que se discuta na contestação apenas o valor da indenização ou então algum vício processual. Se o réu quiser discutir questões relacionadas ao interesse social, utilidade pública etc., deve propor uma outra ação autônoma.

OUTRAS ESPÉCIES DE INTERVENÇÃO PÚBLICA NA PROPRIEDADE

Requisição: é para atender necessidades coletivas urgentes e transitórias, em caso de iminente perigo público. CF, art. 5º, XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;

Limitação administrativa: "é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social. (...) Sem produzir um total aniquilamento da propriedade ou das atividades reguladas. (...) Hão de ser gerais, isto é, dirigidas a propriedades indeterminadas, mas determináveis no momento de sua aplicação" Meirelles (1993, p. 537). 

Servidão administrativa: "é o ônus real de uso imposto pela Administração à propriedade particular para assegurar a realização e conservação de obras e serviços públicos ou de utilidade pública, mediante indenização dos prejuízos efetivamente suportados pelo proprietário" Meirelles (1993, p. 530). 

Ocupação temporária: "é a utilização transitória, remunerada ou gratuita, de bens particulares pelo Poder Público, para a execução de obras, serviços ou atividades públicas ou de interesse público. O fundamento da ocupação temporária é, normalmente, a necessidade de local para depósito de equipamentos e materiais destinados à realização de obras e serviços públicos nas vizinhanças da propriedade particular" Meirelles (1993, p. 536). Incide sobre imóveis desocupados ou improdutivos. 







Referências:
ALEXANDRINO, Marcelo. PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 20. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. 

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 18. ed. atual. por Eurico de Andrade Azevedo; Délcio Balestero Aleixo; José Emanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 1993.

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