3 de nov. de 2016

D. Penal: Violência Sexual Mediante Fraude (art. 215)

Violência Sexual Mediante Fraude

Art. 215.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Parágrafo único.  Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.

Mirabete explica que "o crime de violência sexual mediante fraude decorre da fusão, com modificações, dos delitos de posse sexual mediante fraude e atentado violento ao pudor mediante fraude, previstos na anterior redação dos arts. 215 e 216" (2015, p. 1550). 

Chamado pela doutrina de estelionato sexual, distingue-se o crime de violação sexual mediante fraude do estupro, porque naquele não há constrangimento empregado pelo agente mediante violência ou grave ameaça, enquanto neste, o agente utiliza-se de métodos ardilosos que viciam a vontade da vítima, induzindo-a em erro, burlando o seu consentimento, fazendo com que tenha o seu exercício de livre liberdade sexual viciado. 

Para alcançar o seu intento e conseguir ter a conjunção carnal ou outro ato libidinoso, o agente se vale de fraude ou outro meio semelhante à fraude, mas que sejam capazes de impedir ou dificultar a livre manifestação de vontade da pessoa. Fraude, no conceito de Prado (2010, p. 607), é "todo engodo, artifício ou ardil apto a enganar o sujeito passivo". Ou seja, a pessoa engana-se na legitimidade da conjunção carnal ou outro ato libidinoso a que se permite envolver-se. Para o delito ser reconhecido é necessário que o erro que a pessoa é induzida decorra de artifício, de uma artimanha adotada pelo agente, e tal estratagema impeça ou dificulte a livre manifestação de sua vontade.

Como exemplos de fraude para a configuração do delito, a Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal traz simular casamento e substituir-se ao marido na escuridão da alcova (n.70). 

Sujeitos do delito

Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, homem ou mulher. Sujeito passivo também, pois o artigo menciona ‘alguém’, ou seja, tanto faz mulher, quanto homem a vítima do crime. É irrelevante a condição pessoal da vítima, pode ser, inclusive, prostituta, sendo que o Código protege a liberdade sexual da pessoa no referido artigo, e não a sua decência ou pudor. 

Estão excluídos de ser sujeitos passivos os menores de 14 anos ou aquelas pessoas em estado de completa vulnerabilidade, pois a prática da conjunção carnal ou outro ato libidinoso com eles caracteriza o crime de estupro de vulnerável, tipificado no art. 217-A.  

Distinção entre o crime de violência sexual mediante fraude (art. 215) e o estupro de vulnerável (art. 217-A, § 1º).

Aquele que, por ‘enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência (art. 217-A, § 1º), é considerado pelo Código Penal como sendo vulnerável. Sendo assim, a pessoa que se insere na dicção do mencionado parágrafo não pode ser vítima do delito de violência sexual mediante fraude (art. 215), e sim de estupro de vulnerável. 

É de se observar que não é apenas a presença da enfermidade ou deficiência mental que tornará a pessoa vulnerável, mas em que extensão isso torna o sujeito incapaz de discernir sobre o ato em que está inserido. No caso de haver condições mínimas de discernimento, que o torne capaz de alguma forma manifestar o exercício de sua vontade, não será considerado o seu estado de vulnerabilidade, e poderá figurar como vítima do delito de violência sexual mediante fraude, como bem esclarece Nucci (2016, p. 216): "no art. 215, está-se diante de aspectos relativos da livre manifestação, ou seja, a vítima, mesmo enferma ou deficiente, tem condições mínimas para perceber o que se passa e manifestar a sua vontade". 

A impossibilidade da vítima oferecer resistência por qualquer outra causa (art. 217-A, § 1º, 2ª parte), é também hipótese de vulnerabilidade. No crime de violência sexual mediante fraude, o agente obtém o consentimento da vítima, porém induzindo-a em erro ao ludibriá-la. Mirabete explica que "na circunstância a que se refere o art. 217-A, § 1º, 2ª parte, o agente não obtém o consentimento da vítima, mas esta, por qualquer causa, está impedida de oferecer resistência" (2015, p. 1553). Ou seja, para configurar o estupro de vulnerável deve haver uma completa impossibilidade de resistência, pois se presente condições que tornem a vítima capaz de resistir de uma ou outra forma, o agente enquadra-se no art. 215, se se amoldar ao tipo. 

Consumação e tentativa

O delito está consumado com a conjunção carnal, ainda que incompleta, ou com a prática de outro ato libidinoso. A tentativa é admissível no momento que o agente emprega fraude com o intuito de ter a conjunção carnal ou outro ato libidinoso, mas não consegue por circunstâncias alheias à sua vontade. 

Tipo subjetivo 

É o dolo específico de através da fraude conseguir ter a conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso. Dolo específico também manifestado quando através da fraude o agente tem a finalidade de obter vantagem econômica. Nesse caso, aplica-se, além da pena de dois a seis anos de reclusão, a pena de multa.  

Aumento de pena

A pena é aumentada de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas (art. 226, I), e aumentada de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela (art. 226, II). 

Ação penal 

Crime que procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação (art. 225). Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos (225, par. ún.). Sendo que se a vítima é menor de 14 anos, o crime caracterizado é o do art. 217-A (estupro de vulnerável), e não do artigo 216. 

Referências
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 16. ed. rev., atual. e amp. Rio de Janeiro: Forense, 2016. 

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código penal interpretado. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2015

PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. v. 2. 8. ed. rev., amp. e atual. Maringá: Revista dos Tribunais, 2010.

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