23 de abr. de 2016

D. Penal - Concurso Formal

CONCURSO FORMAL

Este concurso se revela na ação única, sendo que através desta única ação do agente ocorre a existência de uma pluralidade de crimes, ou seja, o concurso formal se compõe de uma ação isolada e essa ação gera duas ou mais infrações penais, sejam elas iguais em espécie ou não. 

Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.
Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código.

Para se configurar o concurso formal, necessariamente há dois requisitos: uma única conduta (ação ou omissão) do agente e mediante essa única conduta haja a realização de dois ou mais crimes, idênticos (homogêneos) ou não idênticos (heterogêneos).

Exemplo de concurso formal é o agente que querendo matar seu desafeto desfere-lhe um único tiro, que além de atingir e matar seu inimigo, o tiro atinge também uma outra pessoa, causando-lhe lesões corporais. Nesse caso do exemplo, os crimes são de espécies diferentes, homicídio (art. 121 CP) e lesão corporal (art. 129 CP). As penas sendo diferentes, aplica-se a mais grave aumentada de um sexto até a metade. Se as penas forem idênticas aplica somente uma delas aumentada também de um sexto até a metade. 

Concurso formal homogêneo: é quando através de uma única conduta resultam dois crimes de espécies iguais. 

Concurso formal heterogêneo: quando os crimes surgidos de uma única conduta não forem idênticos. 

Concurso formal perfeito e imperfeito
O que diferencia o concurso formal perfeito do imperfeito é o elemento subjetivo do agente, o que se passa em sua mente, qual é o seu desejo, a sua intenção. "A distinção varia de acordo com a existência do elemento subjetivo do agente ao iniciar a sua conduta" Greco (2015, p. 669).

O concurso formal perfeito ocorre a partir de :
a) uma única conduta culposa com a ocorrência de dois ou mais crimes. Exemplo é o agente que dirige de forma imprudente e, culposamente, atropela e causa a morte de várias pessoas. Aplica-se a pena de um único homicídio, com um aumento de um sexto até a metade. 

b) uma única conduta dolosa com o acontecimento de um resultado culposo. Exemplo é o agente que quer abater seu desafeto como um tiro de revólver, erra na mira e acerta um outro alguém de raspão que passava pelo local lhe causando lesão corporal. Tentou matar uma pessoa, mas por erro na execução causou lesão corporal a título de culpa em outro. Configura-se concurso formal perfeito, pois de uma única conduta surgiu dois resultados típicos. Responde por tentativa de homicídio contra quem pretendeu abater. A pena da tentativa será aplicada com um aumento de um sexto até a metade.

No exemplo acima, o resultado típico surgiu através de um único desígnio, de um único propósito.  

O concurso formal perfeito está em conformidade com a primeira parte do art. 70: "quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade".

A segunda parte do art. 70 vale para o concurso formal imperfeito. Aqui, o agente tem vários desejos, vários propósitos (desígnios autônomos). O código fala que as penas serão aplicadas de forma cumulativa se a conduta é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos.  Desígnios autônomos são o desejo interno do agente de produzir ou assumir o risco de produzir resultados vários através de sua conduta dolosa única. Internamente ele sabe que produzirá não só o resultado desejado (dolo direto), mas também assume o risco de que outros resultados se seguirão (dolo indireto), ou até mesmo ele quer que todos os resultados típicos se produzam (dolo direto em todos). 

Ilustrando: o agente quer matar todos os quatro membros de uma mesma família e decide colocar veneno na panela da feijoada que eles se alimentarão. Morrem todos. O desejo interno do agente, seu propósito, era que cada membro da família fosse abatido, desígnio autônomo à cada membro. A sua vontade inicial era o resultado morte de cada um, praticando uma única conduta. Assim, como determina o Código, a sua pena, quando condenado, será aplicada de forma cumulativa, como se aplica às penas no concurso material. Caracteriza-se, portanto, concurso formal imperfeito.

Guilherme de Souza Nucci leciona que "a intenção do legislador, nessa hipótese, é retirar o benefício daquele que, tendo por fim deliberado e direto atingir dois ou mais bens jurídicos, cometer os crimes com uma só ação ou omissão" (2005, p. 369).

O concurso formal imperfeito configura-se apenas em crimes dolosos.   

Concurso material benéfico 
Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código.
Se a pena obtida do concurso formal for superior a que seria aplicada se levasse em conta a regra do concurso material, esquece a regra do concurso formal e utiliza o critério do concurso material (cumulativamente). É o que determina o parágrafo único do art. 70.

Explica Bonfim e Capez que "impede-se, assim, que, numa hipótese de aberratio ictus (homicídio doloso mais lesões culposas), se aplique ao agente pena mais severa, em razão do concurso formal, do que a aplicável, no mesmo exemplo, pelo concurso material. 

Erro na Execução / Aberratio ictus
Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.
É o erro acidental. O agente pretende acertar uma pessoa, mas por erro na execução termina por atingir pessoa diversa. A quer atingir B, mas acerta C.

"O erro na execução envolve somente pessoas (...)" Nucci (2005, p. 381).

São duas modalidades de aberratio ictus:  

a) aberratio com resultado único (de unidade simples): previsto na primeira parte do art. 73. O agente pretende atingir uma pessoa, mas por erro na execução, ele atinge pessoa diversa, nada ocorrendo quanto a vítima virtual (aquela que queria acertar). Exemplo é o agente que, por vingança, decide matar o filho de 13 anos de seu desafeto e desfere-lhe um tiro, erra o alvo e acerta e mata o pai da criança. Responde por homicídio doloso com a agravante prevista na alínea 'h' (contra criança) do inciso II do art. 61 do CP. Atendendo-se, assim, ao disposto no § 3º do art. 20 do CP:  

§ 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Tomando o mesmo exemplo supra, caso o pai da criança tivesse apenas lesões corporais, respondia o agente por tentativa de homicídio com a agravante de ter sido contra criança, invocando, ainda, a aplicação da primeira parte do art. 73. 

b) aberratio com resultado duplo (de unidade complexa): previsto na segunda parte do art. 73: "no caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código". Greco explica que "há um resultado duplo, razão pela qual a unidade é tida como complexa" (2015, p. 693). Aplica-se a pena mais grave do resultado atingido mais o aumento de 1/6 até a metade. 

Referências: 
BONFIM, Edilson Mougenot. CAPEZ, Fernando. Direito Penal. Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2004

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015.


NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 5. ed. rev., atual., ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005

Nenhum comentário:

Postar um comentário