26 de mai. de 2018

OAB - 2018 - XXIII - Segunda Fase - Direito Penal (Alegações Finais)

FGV - 2017 - OAB - Exame de Ordem Unificado - XXIII - Segunda Fase - Direito Penal

(Aplicada em 17/09/2017)

No dia 23 de fevereiro de 2016, Roberta, 20 anos, encontrava-se em um curso preparatório para concurso na cidade de Manaus/AM. Ao final da aula, resolveu ir comprar um café na cantina do local, tendo deixado seu notebook carregando na tomada. Ao retornar, retirou um notebook da tomada e foi para sua residência. Ao chegar em casa, foi informada de que foi realizado registro de ocorrência na Delegacia em seu desfavor, tendo em vista que as câmeras de segurança da sala de aula captaram o momento em que subtraiu o notebook de Cláudia, sua colega de classe, que havia colocado seu computador para carregar em substituição ao de Roberta, o qual estava ao lado. 

No dia seguinte, antes mesmo de qualquer busca e apreensão do bem ou atitude da autoridade policial, Roberta restituiu a coisa subtraída. As imagens da câmera de segurança foram encaminhadas ao Ministério Público, que denunciou Roberta pela prática do crime de furto simples, tipificado no art. 155, caput, do Código Penal. O Ministério Público deixou de oferecer proposta de suspensão condicional do processo, destacando que o delito de furto não é de menor potencial ofensivo, não se sujeitando à aplicação da Lei nº 9.099/95, tendo a defesa se insurgido. 

Recebida a denúncia, durante a instrução, foi ouvida Cláudia, que confirmou ter deixado seu notebook acoplado à tomada, mas que Roberta o subtraíra, somente havendo restituição do bem com a descoberta dos agentes da lei. Também foram ouvidos os funcionários do curso preparatório, que disseram ter identificado a autoria a partir das câmeras de segurança. Roberta, em seu interrogatório, confirma os fatos, mas esclarece que acreditava que o notebook subtraído era seu e, por isso, levara-o para casa. Foi juntada a Folha de Antecedentes Criminais da ré sem qualquer outra anotação, o laudo de avaliação do bem subtraído, que constatou seu valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), e o CD com as imagens captadas pela câmera de segurança. O Ministério Público, em sua manifestação derradeira, requereu a condenação da ré nos termos da denúncia. 

Você, como advogado(a) de Roberta, é intimado(a) no dia 24 de agosto de 2016, quarta-feira, sendo o dia seguinte útil em todo o país, bem como todos os dias da semana seguinte, exceto sábado e domingo. 

Considerando apenas as informações narradas, na condição de advogado(a) de Roberta, redija a peça jurídica cabível, diferente de habeas corpus, apresentando todas as teses jurídicas pertinentes. A peça deverá ser datada no último dia do prazo para interposição. (Valor: 5,00) 

Obs.: o examinando deve indicar todos os fundamentos e dispositivos legais cabíveis. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação





----------------
Modelo da peça: 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA CRIMINAL DA COMARCA DE MANAUS/AM 

Processo n. ...

Roberta, já qualificada nos autos do processo em epígrafe, vem, muito respeitosamente, diante de Vossa Excelência, através de seu advogado infrafirmado, procuração em anexo, oferecer ALEGAÇÕES FINAIS, na forma do art. 403, §3º do Código de Processo Penal,  nos seguintes termos: 

1. SÍNTESE FÁTICA

Conforme narrado na denúncia, Roberta, no dia 23.02.2016, então com 20 anos de idade, teria furtado um notebook pertencente a Cláudia na cantina de um curso preparatório para concurso na cidade de Manaus/AM. 

Com base nesses fatos foi denunciada pela prática do crime previsto no art. 155, caput, do Código Penal.

O Ministério Público deixou de oferecer proposta de suspensão condicional do processo, destacando que o delito de furto não é de menor potencial ofensivo.

A denúncia foi recebida e houve regular instrução do processo. 

Em juízo, a vítima Cláudia confirmou ter deixado seu notebook acoplado à tomada, mas que Roberta o subtraíra.

Roberta, em seu interrogatório, confirma os fatos, mas esclarece que acreditava que o notebook subtraído era o seu e, por isso, levara-o para casa.

2. PRELIMINARES: Do oferecimento da suspensão condicional do processo

O delito imputado a Roberta, esta que não está sendo processada e nunca foi condenada por outro crime, possui cominação mínima de um ano, o que significa que a proposta de suspensão condicional do processo devia ter sido oferecida pelo Ministério Público quando do oferecimento da denúncia, por ser um dever imposto por lei. Assim, a alegação de que o crime de furto não é de menor potencial ofensivo como justificativa para o não oferecimento da proposta sucumbe à dicção do art. 89 da Lei 9.099/95, que prevê que caberá ao Ministério Público oferecer a suspensão do processo quando a pena mínima cominada ao crime imposto for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, preenchidos os demais requisitos legais, dentre os quais a primariedade do agente e a presença dos requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

Tendo em vista que não foi oferecida a proposta da suspensão condicional do processo, deve ser imposta a nulidade de toda instrução processual, nos termos do art. 564, IV do Código de Processo Penal, ou, se for o caso de entendimento diverso e insista o Ministério Público pelo não oferecimento, que sejam remetidos os autos ao Procurador de Justiça, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.  

3. MÉRITO: Da ocorrência do erro de tipo essencial

Roberta, na data do fato, ao final da aula, resolveu ir comprar um café na cantina, tendo deixado seu notebook carregando na tomada. Ocorre que ao retornar retirou o notebook de Cláudia da tomada achando que era o seu. Quando inquirida em juízo, confirma os fatos, mas esclarece que acreditava que o notebook subtraído era seu e, por isso, levara-o para casa. 

Dispõe o caput do art. 155 do Código Penal que pratica furto quem subtrai coisa alheia móvel para si ou para outrem, sendo que de acordo com o esclarecido por Roberta ela incorreu em erro em relação a uma das elementares do tipo penal do furto, qual seja, a coisa alheia móvel, pois levou o notebook de Cláudia para casa achando que era o seu, equívoco tal que exclui a configuração do crime. 

O art. 20 do Código Penal aduz que o erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. Sabe-se que crime é todo fato típico, ilícito e culpável. O fato típico tem como uma de suas características a conduta, sendo que esta deve ser dolosa ou culposa a fim de que seja configurada a característica típica do fato. Na conduta de Roberta não restou caracterizado nem o dolo nem a culpa, sendo que o erro de tipo que ela incorreu era escusável, achava de forma sincera que não estava praticando um crime, movida por um equívoco. 

Resta, assim, absolutamente, caracterizada a atipicidade de sua conduta. Ainda que o erro fosse inescusável, não há previsto no delito de furto a modalidade culposa. Deve, pois, ser absolvida nos termos do art. 386, III ou VI, do Código de Processo Penal.

4. TESES SUBSIDIÁRIAS

Na hipótese de Vossa Excelência não se filiar com o exposto acima, a defesa apresenta as seguintes teses subsidiárias:

4.1 Da pena-base em seu mínimo legal

Roberta é primária, sua Folha de Antecedentes Criminais não há nenhuma outra anotação. Sendo assim, na hipótese de uma eventual condenação, a pena-base aplicada deve ser fixada em seu mínimo legal, já que favorável à ré todas as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal e seus bons antecedentes. 

4.2 Da confissão e menoridade relativa

A ré confessou em juízo o fato, ainda que tenha se movido por lapso. Dessa forma, na segunda fase da dosimetria deve ser reconhecida a atenuante da confissão, prevista no art. 65, III, d, do Código Penal, e reconhecida de igual forma, a atenuante da menoridade relativa (art. 65, I, do Código Penal), pois à época do fato contava com 20 anos de idade. 

4.3 Do arrependimento posterior

Roberta está sendo acusada de um crime em que não houve o emprego de violência ou grave ameaça, sendo que restituiu, por livre e espontânea vontade, o bem da suposta vítima quando viu se tratar de um engano. Dessa forma há a possibilidade de se reconhecer o arrependimento posterior, e a redução da pena na sua fração máxima, qual seja, dois terços, nos termos do art. 16 do Código Penal. 

4.4 Da substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos

A pena a ser aplicada a acusada não passará de quatro anos, na conduta não houve o emprego de violência ou grave ameaça, ela não é reincidente em crime doloso, assim, no caso de aplicação de pena privativa de liberdade, esta deve ser substituída por penas restritivas de direitos, pois presentes todos os requisitos do art. 44 do Código Penal. 

4.5 Do regime aberto de cumprimento de pena

O regime inicial de cumprimento de pena deve ser o aberto, pois preenchidos os requisitos do art. 33, § 2º, c, do Código Penal, que prevê que o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

5. PEDIDOS

Diante de todo o exposto, requer principalmente:

a) nulidade da instrução processual em razão do não oferecimento da proposta da suspensão condicional do processo. 

b) absolvição com base no art. 386, III ou VI do Código de Processo Penal, em decorrência do reconhecimento do erro de tipo essencial. 

Requer subsidiariamente:

a) a aplicação da pena base em seu mínimo legal, diante das condições favoráveis do art. 59 do Código Penal.

b) o reconhecimento, na segunda fase da dosimetria, das atenuantes previstas no art. 65, I e III, d, do Código Penal. 

c) na terceira fase da dosimetria, a aplicação da redução de pena em sua fração máxima em virtude do arrependimento posterior previsto no art. 16 do Código Penal.

d) em caso de aplicação de pena privativa de liberdade a sua substituição por penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44 do Código Penal. 

e) no caso do douto juiz entender pelo efetivo cumprimento de pena privativa de liberdade que seja estabelecido o regime aberto, nos termos do art. 33, §2º, c, do Código Penal. 

Nestes termos, 
Pede deferimento
Manaus/AM, 29 de agosto de 2016
Advogado
Número da OAB

9 comentários:

  1. Muito obrigada por disponibilizar a peça corrigida.

    ResponderExcluir
  2. Muito bem redigida, parabéns!

    ResponderExcluir
  3. Pequeno lapso: uma das atenuantes está no artigo 65,III, b, e não 65,III,a.
    Obrigado, me ajudou bastante.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, muito obrigado! Fiz a correção. Na verdade, trata-se da atenuante prevista na alínea 'd' (confissão).

      Bons estudos.

      Excluir
  4. Boa tarde! Oi Roberto! preciso de material para fazer meu Projeto TCC (Pesquisa científica) no Curso de Direito, meu tema é O INSTITUTO DA REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA EM TEMPOS DE PANDEMIA - meu problema a ser respondido é: Quais os critérios da requisição administrativa em tempos de pandemia? Vc pode me ajudar? Obrigado

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, tudo bom? No momento não tenho me aprofundado sobre esse tema, no entanto algo bastante atual. Desejo sucesso em seu TCC e em toda a sua carreira! Muito obrigado

      Excluir
  5. Estou com uma dúvida estou fazendo trabalho da faculdade e tem um limite de linhas só sobrou quatro no final posso colocar neste termo pede deferimento junto na mesma linha sem espaço

    ResponderExcluir