22 de ago. de 2016

D. Penal: Classificação dos Crimes

Classificação dos Crimes


"Classificar doutrinariamente um tipo penal significa o mesmo que apontar a sua natureza jurídica. Uma vez detectada a natureza jurídica de uma infração penal, o trabalho do intérprete fica extremamente facilitado no sentido de conhecer os vários aspectos que lhe são relevantes, como o seu momento de consumação, se é possível a tentativa, etc." Greco (2008, p. 91). 

Nas classificações legais, o próprio Código Penal se encarrega de trazer os conceitos. 

Crime Tentado e Crime Consumado
Art. 14 - Diz-se o crime:
I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;

II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Crime Impossível
Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

Crimes Dolosos e Culposos
Art. 18 - Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;

II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

O parágrafo único significa dizer que todo delito, em regra, é doloso. Quando um tipo penal aceita a modalidade culposa, deve vir, por força da lei, previsto a culpa, caso contrário, é apenas acolhido o dolo. 

O crime de furto não admite a forma culposa. Se alguém subtrai para si coisa móvel alheia, por achar que aquele objeto lhe pertence (talvez por ser muito parecido com o seu), incorre em erro sobre elementos do tipo (art. 20). Tal artigo apenas prevê a punição se no tipo de conduta praticada há previsto a culpa. Como no furto não há a modalidade culposa, o fato torna-se atípico. 

Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

Crime Continuado
Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.

QUANTO A RELAÇÃO CONDUTA E RESULTADO
- Crime material: é aquele que para se consumar é indispensável que a conduta provoque um resultado, este previsto no tipo penal, necessariamente. O crime de furto é material, pois para sua configuração é preciso que ocorra, efetivamente, a subtração da coisa alheia móvel. O delito de estupro é outro exemplo de crime material, mediante o constrangimento da vítima, para o estupro se consumar é preciso a realização da conjunção carnal ou de outro ato libidinoso. Outro exemplo é o estelionato

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel. 

Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento

Art. 213.  Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. 

- Crime formal ou de consumação antecipada: o tipo penal prevê o resultado, mas para que ocorra a consumação basta a conduta do agente, sem necessidade de provocar o resultado previsto. Exemplo é a extorsão, em todas as suas modalidades, e o crime de ameaça. 

Extorsão mediante sequestro
Art. 159 - Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate. 

A conduta do agente de sequestrar pessoa com o intuito de obter vantagem indevida é suficiente para consumação do delito. 

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:

- Crime de mera conduta: não há no tipo penal a previsão de qualquer resultado, pois para a consumação basta que o agente pratique a conduta prevista. Exemplos são os crimes de violação de domicílio (art. 150) e desobediência (art. 330). 

Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público

QUANTO A QUALIDADE DO AGENTE
- Crime comum: pode ser praticado por ou contra qualquer pessoa, não exigindo o Código uma qualidade especial dos sujeitos. Exemplo é o furto, roubo, ameaça, homicídio, estelionato. 

- Crime próprio: o tipo penal exige uma qualidade especial dos sujeitos. O infanticídio (art. 123), o peculato (art. 312) e a corrupção passiva (317) são exemplos.  

Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio.

Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem

- Crime de mão própria: é aquele que jamais se pode transferir ou delegar a execução para alguma outra pessoa fazer. Apenas pode ser cometido diretamente pela pessoa, aquele que está praticando a conduta criminosa, e mais ninguém. Exemplos: falso testemunho (art. 342) e prevaricação (art. 319).

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral

QUANTO A FORMA DA CONDUTA PRATICADA
- Crime comissivo ou de ação: é aquele praticado através da ação do agente. Exemplos: furto, extorsão, roubo, homicídio, estelionato, etc. 

- Crime omissivo: é aquele que a não ação do agente produz um resultado ilícito. Não há um dever de agir, por isso o agente não responde pelo resultado causado, mas apenas por que não agiu. Exemplo: Omissão de socorro (art. 135)

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. 

- Crimes omissivos (impróprios) / comissivos por omissão: também se consumam pela não ação do agente. Contudo, exige-se que o omissor tenha o dever de agir, a lei lhe atribui essa condição. Nesse caso, responde pelo resultado provocado.  

QUANTO A QUANTIDADE DE ATOS QUE INTEGRAM A CONDUTA
- Crimes unissubsistentes: é aquele que em um único ato executório o crime está consumado. Nesses crimes, a conduta não pode se fragmentar, não se admite que o agente opte por vários atos capazes de executar o crime. Esses crimes não admitem a tentativa. Exemplo é a injúria e também a ameaça. 

- Crimes plurissubsistentes: quando em uma única conduta é desdobrada em vários atos capazes de executar o crime. Exemplo: furto, homicídio, estupro etc. 

QUANTO AO MOMENTO DE CONSUMAÇÃO
- Crime instantâneo: o resultado não se prolonga no tempo, se dá instantaneamente. O agente pode levar horas para consumar o delito, contudo a sua conduta não define o momento da consumação. Exemplo é o furto. No momento em que a coisa sai da esfera de posse da vítima, o delito está consumado. O estupro é outro exemplo de crime instantâneo. No exato instante da conjunção carnal, configura-se o delito. 

- Crime permanente: o resultado se prolonga no tempo. O bem jurídico se encontra em situação duradoura de agressão. Exemplo é o sequestro e cárcere privado (art. 148). Enquanto a vítima estiver com sua liberdade privada, o crime permanece se consumando. Outro exemplo é a extorsão mediante sequestro (art. 159). 

Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado.

Art. 159 - Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate:

- Crime instantâneo de efeito permanente: o resultado se dá de forma instantânea, mas seus efeitos são irreversíveis. O homicídio é um exemplo clássico, o resultado morte é instantâneo, mas resultado este irreversível. O dano (quando na forma de destruição) é um outro exemplo. 

QUANTO AO NÚMERO DE AGENTES 
- Crime unissubjetivo: pode ser praticado por um só agente. Contudo admite coautoria e participação. Exemplo: furto, lesão corporal, roubo, homicídio etc. 

- Crime plurissubjetivo: o tipo penal exige a presença de duas ou mais pessoas. Exemplos: rixa (art. 137), bigamia (art. 235), associação criminosa (art. 288).

QUANTO AO EXAME PERICIAL
- Crimes transeuntes: esses crimes não deixam vestígios, por isso não há a necessidade do exame pericial. Exemplos: calúnia, difamação, injúria, ameaça. 

- Crimes não transeuntes: crimes que deixam vestígios, por isso invocam o exame pericial. Exemplos: homicídio, lesão corporal, dano etc. 

QUANTO AO GRAU DE INTENSIDADE 
- Crime de dano: para se consumar deve haver a efetiva lesão ao bem jurídico tutelado. Exemplos: furto, roubo, lesão corporal, homicídio

- Crime de perigo: é quando a conduta do agente causa um perigo de dano ao bem jurídico. Se o dolo do agente está dirigido a causar efetiva lesão ao bem jurídico alvo de sua conduta, mas apenas fica na forma tentada, responde pelo delito que intencionou praticar, na forma tentada. Mas, se sua conduta não está dirigida para causar lesão a determinado bem jurídico, mas provoca uma situação de perigo, se esta situação estiver tipificada, responde por tal crime. Crime este classificado como crime de perigo. São delitos subsidiários. Exemplo: rixa (art. 137), periclitação da vida e da saúde (art. 132), abandono de incapaz (art. 133), abandono de posto (art. 195 CPM), porte ilegal de arma (art. 14, da Lei nº 10.826/03). 

Art. 195 CPM. Abandonar, sem ordem superior, o pôsto ou lugar de serviço que lhe tenha sido designado, ou o serviço que lhe cumpria, antes de terminá-lo

QUANTO A EXISTÊNCIA AUTÔNOMA OU NÃO DE CRIME
- Crimes principais: existem de forma autônoma, independente da existência de qualquer outro crime relacionado. Exemplos: furto, homicídio. 

- Crimes acessórios: são delitos que pressupõem a existência de um crime anterior. Exemplo é a receptação (art. 180), favorecimento pessoal (art. 348), favorecimento real (art. 349). 

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte

Art. 348 - Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão.

Art. 349 - Prestar a criminoso, fora dos casos de co-autoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime

CLASSIFICAÇÕES DIVERSAS
  
- Crimes de forma livre: o tipo penal não faz qualquer exigência quanto a forma de ser praticado o delito. Exemplo é o homicídio, que pode ser cometido de diversas maneiras, como asfixia, envenenamento, afogamento etc. 

- Crimes de forma vinculada: o tipo penal dispõe a forma como a conduta executa o crime. Exemplos: curandeirismo (art. 284), estupro de vulnerável (art. 217-A)

Art. 284 - Exercer o curandeirismo:
I - prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância;
II - usando gestos, palavras ou qualquer outro meio;

Art. 217-A.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos. 

- Crimes simples: no tipo penal há previsto apenas um modelo de crime. Exemplo é o homicídio. 

- Crimes complexos: é a combinação de dois ou mais tipos penais em um único. Exemplo: roubo (art. 157). Há a presença da subtração (furto), grave ameaça (art. 147) ou violência (lesão corporal).  

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência. 

- Crimes conexos: quando um crime se relaciona, liga-se para facilitação ou ocultação de um outro crime. Os delitos se interligam por um sentido teleológico ou consequencial.

Conexão teleológico: o crime é praticado para assegurar a execução de outro delito.

Conexão consequencial: crime praticado após a consumação de delito anterior, ou seja, para assegurar a impunidade, ocultação ou vantagem de outro delito

Art. 61 São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;

- Crimes qualificados e privilegiados: a qualificação é uma espécie de infração conectada, mediante os parágrafos, de alguma forma ao caput de determinado tipo penal. Quando o delito é qualificado, as penas mínima e máxima abstratamente previstas são modificadas, aumentando a cominação penal. A alteração, em quantidade superior, do mínimo e máximo previsto que revela o delito na sua forma qualificada. É a diferença fundamental do delito majorado. Na majoração, existe alguma circunstância que agrava o delito e, consequentemente, restará previsto uma causa de aumento de pena através de algum fracionamento. No crime privilegiado, há uma circunstância prevista no parágrafo do tipo penal que causa uma diminuição de pena, que ficará inferior à prevista para o caput

Exemplos: 

Homicídio simples
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Caso de diminuição de pena (homicídio privilegiado
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Homicídio qualificado
§ 2° Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;
II - por motivo fútil;
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;
V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

- Crime habitual: diversos atos reiterados do agente constroem o delito.  

Curandeirismo
Art. 284 - Exercer o curandeirismo:
I - prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância;

- Crime profissional: diz-se que é o crime habitual cometido com fins lucrativos. 

Rufianismo
Art. 230 - Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça

Referências: 
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial. vol. II. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. 

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